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segunda-feira, 12 de abril de 2010

A 13 de Abril Portugal e China acordaram e assinaram a devolução de Macau á China


Macau

As prioridades pós-transição

A lista é longa e complexa: viabilização económica, aprofundamento do processo democrático, reforma administrativa, consolidação do sistema jurídico e desenvolvimento das relações externas. Estes são os grandes testes que esperam Macau depois da transição.
A transferência da Administração de Macau de Portugal para a República Popular da China em 20 de Dezembro reveste-se de um duplo simbolismo já que marca não apenas o fim do ciclo colonial português mas também a extinção da última colónia na Ásia, representando para a China o fim da presença estrangeira no seu território e para a região o encerramento do processo de descolonização iniciado em 1947. Este duplo simbolismo marcou profundamente, ainda que nem sempre de forma visível, o processo de transição e as negociações entre Portugal e a China, explicando em parte a estratégia de "risco zero" adoptada por Portugal que viu Macau como a última oportunidade de sublimação dos traumas da descolonização africana.
A transição de Macau para a China foi um processo longo e complexo que, ao contrário de Hong Kong, não se iniciou com a assinatura de uma Declaração Conjunta mas sim em 1967 com a alteração estrutural da posição de Portugal marcada pelo fim de facto da soberania portuguesa e pela emergência de um novo quadro de relações luso-chinesas na gestão de Macau. A transição incluiu, assim, duas fases distintas, a primeira dominada pela fórmula específica de Macau como" território chinês sob administração portuguesa" consagrada no acordo secreto de 1979, e a segunda pela aplicação da fórmula de Hong Kong (baseada no conceito dengista de "um país, dois sistemas" originalmente concebido para Taiwan) a Macau a partir de 1987.
A compreensão da natureza e dinâmica da primeira fase é fundamental para a compreensão da segunda, geralmente referenciada como a transição formal, já que a primeira condicionou e determinou as posições negociais de Portugal e da China durante a segunda fase do processo.
A manutenção da presença portuguesa em Macau nas últimas três décadas resultou, paradoxalmente, mais da vontade da China do que de Portugal. Com efeito, os acontecimentos de 1966, o "1,2,3" que representou o impacto da Revolução Cultural em Macau, marcaram o início de uma nova fase da presença portuguesa caracterizada por um significativo enfraquecimento do controlo político e por uma crescente influência da China na governação de Macau, configurando um sistema de partilha de soberania.
Portugal propôs por duas vezes a devolução de Macau, a primeira em 1967, numa iniciativa inédita e discreta de Salazar que visou evitar uma "Segunda Goa", e depois em 1975 no contexto do processo geral da descolonização. Em ambas as ocasiões a China recusou esta oferta fundamentalmente por causa de Hong Kong, receando o impacto negativo que uma tal mudança teria sobre a estabilidade e a confiança na colónia que funcionava como a principal "janela" de contacto de Beijing com o exterior. Além disso, os sectores mais moderados da liderança chinesa, em particular Zhou Enlai, entenderam que estando a China em pleno tumulto da Revolução Cultural esta não seria a altura propícia para tomar uma decisão de repercussões tão significativas existindo nomeadamente o receio de que Macau pudesse vir a ser controlado pelos sectores radicais. Na perspectiva chinesa a pressão para uma solução rápida diminuiu ainda mais quando a partir de 1972 a China obteve o reconhecimento internacional da especificidade dos estatutos de Hong Kong e Macau, com a respectiva retirada da lista de territórios a descolonizar do Comité de Descolonização da ONU, o que reduzia o risco de um processo de auto-determinação.
Importa salientar que a posição da China sobre Macau, quer quanto ao congelamento da descolonização quer quanto à definição do timing e formato da transição formal, foi sempre determinada pelos objectivos específicos da estratégia mais global de reunificação que envolve também Hong Kong e Taiwan.
Tal facto teve um duplo efeito de sinal contrário. Por um lado, limitou a margem de manobra negocial portuguesa já que desvalorizou a importância da natureza das relações bilaterais entre Portugal e a China no sentido de que, contrariamente às expectativas portuguesas, a existência de boas relações políticas entre Lisboa e Beijing não significou uma maior flexibilização das posições chinesas nem um tratamento muito diferenciado e mais favorável para Macau. Por outro lado, esta ligação aumentou mais do que proporcionalmente a importância de Macau para a China, vincando, na ausência de uma relevância económica, a natureza eminentemente política do interesse chinês por Macau como elemento do processo político de reunificação e de afirmação do nacionalismo.
A questão do estacionamento de forças militares na Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), objecto de recente polémica entre Portugal e a China, é um exemplo elucidativo da aplicação desta lógica. Com efeito, e independentemente da existência ou não de um acordo de cavalheiros, a posição de Beijing sobre esta matéria, anunciada logo a seguir à reunificação de Hong Kong, foi determinada não pelo estado das relações bilaterais luso-chinesas ou por considerações específicas sobre Macau mas sim pelo efeito de demonstração destinado a Taiwan, deixando bem claro que relativamente a qualquer solução futura a presença das Forças Armadas é um símbolo de soberania inegociável e sugerindo que a questão militar será seguramente a mais difícil e complexa de todo o processo negocial com Taiwan.
O aspecto de maior relevância nas vésperas da transferência da Administração prende-se com a existência de condições que assegurem a sustentabilidade futura e a autonomia do "segundo sistema" em Macau, as quais dependem em boa parte da acção preparatória desenvolvida no passado pela Administração portuguesa mas também da acção futura do Governo da RAEM e da própria sociedade civil de Macau. O futuro do "segundo sistema" e a sua autonomia defrontam-se com algumas dificuldades e incertezas, mais acentuadas do que no caso de Hong Kong, resultantes quer das fragilidades objectivas intrínsecas de Macau decorrentes da sua reduzida dimensão e visibilidade quer das insuficiências da estratégia portuguesa.
À futura RAEM colocam-se três desafios fundamentais nos planos económico, político-administrativo e das relações externas. Contrariamente à ideia de imobilismo e conservação geralmente associada à garantia incluída na Declaração Conjunta de manutenção do sistema social, político e económico de Macau nos próximos 50 anos, a preservação da autonomia e identidade de Macau exigem mudanças e reformas, no respeito pelos princípios da Declaração Conjunta e do modelo "um país, dois sistemas".
No plano económico, os principais desafios relacionam-se com a necessidade de um novo modelo de internacionalização e diversificação da estrutura da economia de Macau, hoje demasiado dependente da indústria do jogo, com o reforço das suas ligações e nível de integração no espaço regional do Triângulo do Sul da China e com a prossecução de um modelo de desenvolvimento mais alicerçado nas características específicas e nas vantagens comparativas de Macau, reinventando novos papéis de intermediação e valorizando o seu capital cultural e humano.
Os ciclos económicos
A evolução recente da economia de Macau conheceu uma sucessão de três ciclos. O primeiro baseado no desenvolvimento do sector do jogo e do turismo durante a década de 60, resultante da nova dinâmica gerada pela criação da STDM em 1962 a quem foi atribuída a concessão da exploração do jogo em regime de monopólio, o qual se transformou no principal motor da economia mas com forte dependência de Hong Kong de onde eram provenientes a grande maioria dos jogadores e dos turistas.
O segundo ciclo, correspondente à década de 70 e primeira metade da de 80, foi o da industrialização baseada no desenvolvimento de indústrias trabalho-intensivas em duas fases distintas (o têxtil e vestuário na década de 70 com uma segunda fase de diversificação na década de 80). Estas eram dominada por capitais e empresários de Hong Kong que procuraram tirar partido do baixo nível de salários e da utilização das quotas de exportação não utilizadas de Macau por forma a contornar as barreiras proteccionistas que as exportações de Hong Kong começavam a enfrentar no mercado mundial. Tratou-se de um processo de deslocalização em que as fases mais complexas do processo produtivo, como o design e o marketing, não foram transferidas para Macau antes ficando retidas na ex-colónia britânica pelo que as vantagens comparativas de Macau permaneceram exclusivamente alicerçadas no baixo custo de mão-de-obra e no baixo nível da carga fiscal.
O terceiro ciclo, claramente mais problemático e que coincide com a fase de transição formal, é marcado pela desindustrialização do final da década de 80 e início dos anos 90, que resultou da deslocalização das indústrias trabalho-intensivas para a RPC, nomeadamente para zonas do Delta do Rio das Pérolas próximas de Macau. Durante este ciclo o jogo manteve e reforçou até nos últimos anos o seu peso na economia, apesar de não se ter modernizado, tendo surgido, em substituição do sector industrial, um segundo motor na economia, o sector do imobiliário/construção, cujo desenvolvimento ficou associado a um forte movimento especulativo, alimentado por capitais de HK e da RPC. O Governo deu também o seu contributo através do descontrolo do sistema de concessão de terras na procura de um aumento fácil de receitas públicas associadas às concessões. Em consequência, instaurou-se uma crise profunda de excesso de oferta neste sector a qual teve efeitos depressivos sobre o resto da economia.
Ao contrário de Hong Kong, a fase final do processo da transição macaense decorreu num clima económico menos favorável já que a partir de 1995 se iniciou um período de estagnação económica que evoluiu para uma recessão com três anos consecutivos de crescimento económico negativo em 1996 (-0.5 por cento), 1997 (-0.1 por cento) e 1998 (-4 por cento). Esta evolução negativa da economia não é apenas explicada pelo impacto da crise asiática em Macau, que se fez sentir sobretudo a partir de 1998, mas também por factores estruturais, quer do lado da oferta quer da procura, relacionados com alguns aspectos já referenciados. A saber: a desindustrialização, a crise no sector imobiliário com cerca de 40.000 fogos que o mercado não consegue absorver, a quebra do investimento, em especial do privado, o que parece denotar problemas de confiança e da qualidade do ambiente para investimento, mas também do público em resultado da conclusão dos grandes projectos de infra-estruturas. Também a sobreavaliação da pataca em consequência da sua ligação ao dólar de Hong Kong e logo ao dólar norte-americano, o que reduziu substancialmente a competitividade das exportações de bens e serviços, agravada a partir de 1997 em consequência do facto de muitos dos concorrentes asiáticos terem efectuado desvalorizações significativas das suas moedas em relação ao US dólar (no mínimo 25 por cento, chegando em alguns casos a 60 por cento).
A sucessão destes ciclos revela uma excessiva vulnerabilidade e dependência de decisões externas e a ausência de uma estratégia proactiva que antecipe mudanças e prepare respostas, que em parte é explicada pela postura de excessivo não-intervencionismo tradicionalmente assumida pela Administração portuguesa. O início de um novo ciclo que garanta a viabilidade económica de Macau, base material da sua autonomia, mais alicerçada nos traços específicos e nas suas vantagens comparativas, poderá envolver a ponderação de alguns ajustamentos de estratégia que passam, entre outros aspectos, por: uma maior aposta no reforço da integração no espaço regional do Delta do Rio das Pérolas, numa lógica de complementaridade e não de competição; por uma melhor articulação entre Governo e meio empresarial, envolvendo uma política activa de apoio às PMEs; pela aposta no sector dos serviços com vista a uma redução da dependência do jogo, cuja modernização poderá implicar repensar o sistema de monopólio, desenvolvendo novas áreas como o turismo cultural (mais orientado para o mercado chinês), a formação e serviços de apoio ao investimento de PMEs no Delta e de internacionalização de empresas chinesas; passa também pelo desenvolvimento de um mecanismo flexível de planeamento estratégico.
Cultura democrática e sistema jurídico
O segundo desafio essencial que se coloca a Macau é no domínio político-administrativo e envolve três questões fundamentais: aprofundamento do processo democrático e reforço da cultura democrática; a reforma administrativa orientada para o reforço da eficiência e da transparência da administração; a consolidação do sistema jurídico.
Apesar de Macau ter sido o precursor do processo de democratização na região com a introdução de um elemento de eleição directa para a Assembleia Legislativa em 1976, o facto é que o processo estagnou a partir de meados dos anos 80 e durante toda a transição ficando imune ao novo ciclo de transições democráticas que se iniciou com a transição filipina e se acelerou na década de 90 (com os casos de Taiwan, Coreia do Sul, Tailândia e mais recentemente Hong Kong). Em resultado da forte influência política dos sectores chineses mais conservadores mas também da insuficiência dos esforços da Administração portuguesa em estimular o desenvolvimento de uma cultura democrática, o sistema permaneceu imaturo, frágil e marcado por um défice democrático. A Lei Básica, que para além de não admitir qualquer alteração significativa do sistema político antes de 2009 ( por exemplo, a eleição do chefe do Executivo por sufrágio directo e universal ou a eleição directa para a maioria dos membros da Assembleia Legislativa) consagra para Macau um regime mais conservador do que o previsto na Lei Básica de Hong Kong (eleição directa de um máximo de 41 por cento dos deputados até 2009, contra 50 por cento no caso de Hong Kong, e não consagração do objectivo último da eleição directa da totalidade dos membros do órgão legislativo), coloca claras limitações à mudança da estrutura formal do sistema político.
No entanto, o novo Governo, confrontado simultaneamente com uma conjuntura económica difícil e com elevadas expectativas da população, tentará provavelmente consolidar a sua legitimidade através da alteração não das regras formais mas sim da prática política, o que poderá passar pela maior abertura do processo de decisão através da criação de novos canais institucionais para a participação dos cidadãos e das organizações da sociedade civil, pela melhoria das relações e maior proximidade entre a Administração e os cidadãos facilitando o acesso destes aos serviços públicos, por uma maior sensibilidade e esforço na compreensão da opinião pública ou até por acções tão concretas como a promoção da educação para a cidadania nas escolas.
Cidadãos mais participativos, uma opinião pública mais activa e a institucionalização de partidos políticos são ingredientes fundamentais para a maturação do sistema, essencial não só para garantir políticas de maior qualidade e uma Administração mais eficiente mas também a autonomia e estabilidade do "segundo sistema".
Reforma administrativa
De igual modo a reforma administrativa tendente a reforçar a eficiência e transparência da Administração foi já identificada como uma prioridade pelo futuro chefe do Executivo, Edmund Ho, durante a campanha que antecedeu a selecção. O desafio que se coloca é o de conseguir introduzir as reformas sem desvirtuar ou pôr em causa os traços fundamentais do modelo da administração de Macau - por outras palavras obter um equilíbrio entre a continuidade e a mudança. A escolha dos membros do futuro Executivo, a maioria com experiência no sistema, tem sido vista como positiva e uma garantia de continuidade, embora a limitada experiência de muitos dos quadros localizados recentemente e o êxodo de muitos técnicos portugueses, a quem não foram dadas em tempo útil garantias suficientes por ambas as partes para permanecerem, constituam motivos de preocupação.
O reforço da transparência e um controlo mais apertado da corrupção, nomeadamente através da revitalização da acção e reforço dos meios do Alto Comissário contra a corrupção nos moldes do ICAC em Hong Kong, constitui outra área de intervenção fundamental. O sucesso destas reformas revela-se essencial não apenas para a prosperidade económica da RAE, através da melhoria do ambiente de investimento e da criação de condições para um planeamento estratégico mais activo, mas também para a legitimação do "segundo sistema" cuja sustentabilidade assenta quer nas garantias formais quer na demonstração prática da sua eficácia e capacidade efectiva para contribuir para a melhoria do bem estar da maioria da população.
A consolidação do sistema jurídico, sem dúvida um dos alicerces da identidade de Macau, é talvez a tarefa mais difícil para a futura RAE não tanto ao nível da estrutura normativa, que foi modernizada e se considera adequada para Macau enfrentar o futuro, mas sim da operacionalidade do sistema, resultante do défice de recursos humanos qualificados e com experiência do sistema (quer ao nível de magistrados quer de advogados), e dos persistentes problemas na área da tradução jurídica cuja qualidade carece de um controlo mais rigoroso. O domínio jurídico, que constitui indubitavelmente a mais importante herança deixada por Portugal em Macau, deverá constituir a primeira prioridade da cooperação futura entre a RAEM e Portugal, afigurando-se essencial que a RAEM saiba desde já tirar partido da experiência de juristas portugueses de qualidade existentes em Macau.
Relações externas
O desenvolvimento das relações externas de Macau constitui o terceiro grande desafio para a futura RAEM. Nesta matéria o que está em causa não é, como em Hong Kong, a preservação do estatuto internacional mas antes a sua construção. O reforço das relações externas de Macau e da sua abertura ao mundo, em paralelo com o reforço das suas relações com a China, constitui um mecanismo essencial não só para garantir a sua viabilidade e prosperidade económica mas também a preservação do "elevado grau de autonomia" interno da RAE e da sua identidade.
Os resultados do período de transição nesta matéria são limitados tendo sido uma das dimensões relativamente esquecidas. Se é certo que foram desenvolvidos esforços e obtidos resultados positivos em algumas áreas como a expansão do número de organizações multilaterais em que Macau participa ou o desenvolvimento das relações com a União Europeia alicerçado no Acordo de terceira geração UE-Macau de 1992, estas foram mudanças que em boa verdade são formais não se tendo traduzido na prática num reforço substantivo da qualidade e intensidade da participação e visibilidade internacional de Macau. A evolução menos positiva neste domínio resultou em primeiro lugar da postura relativamente centralizadora e pouco flexível de Lisboa que no plano das relações externas, em particular bilaterais, nunca viu com bons olhos o desenvolvimento de uma autonomia de Macau não tendo igualmente facilitado a participação dos delegados de Macau na delegação portuguesa a Conferências Internacionais ou organizações multilaterais restritas a Estados.
Por seu lado o Governo de Macau, não obstante os esforços ad hoc que desenvolveu nos últimos anos no estabelecimento de laços mais próximos com países lusófonos, não apostou suficientemente numa estratégia para as relações bilaterais, nem na criação das condições práticas para uma mais efectiva participação internacional, nomeadamente a preparação de recursos humanos locais nas áreas da diplomacia económica e da negociação internacional, a expansão da rede de representações externas ainda hoje restrita apenas a uma única representação em Bruxelas, e o desenvolvimento de novos instrumentos mais informais.
O novo enquadramento das relações externas de Macau no pós-transição cria potencialmente condições mais favoráveis para o desenvolvimento das relações externas de Macau ao definir claramente áreas de autonomia em que a RAE pode desenvolver "por si própria relações, celebrar ou executar acordos" (art.136 LB), restritas a áreas de low politics, e ao definir regras sobre as relações entre o Governo central e a RAE neste domínio.
Neste contexto tem sido defendida a ideia de que as relações com a UE e os seus Estados Membros deveriam constituir um dos eixos prioritários da RAEM, podendo esta vir a desempenhar um papel renovado e útil nas relações entre a UE e a China no século XXI. Esta questão foi objecto da reflexão de um conjunto de personalidades europeias de que resultou um relatório apresentado em Bruxelas em Março de 1999, o qual reconhece a existência de oportunidades objectivas e da capacidade potencial de Macau para desempenhar funções específicas em áreas como as da internacionalização das PMEs, do multiculturalismo ou da formação.
Na perspectiva de Macau esta parece ser uma ideia mobilizadora mas cuja concretização depende de diversas condições. Em primeiro lugar, a capacidade de iniciativa rápida por parte do Governo da RAE por forma a tirar partido do interesse e da visibilidade internacional acrescida de Macau durante a recta final do processo de transferência e no período inicial de vida da RAE. Em segundo lugar, a capacidade de Macau compreender as prioridades e sentido da evolução futura das relações UE-China, nomeadamente as áreas de interesse comum, por forma a garantir a relevância e adequação da sua acção e o reconhecimento da utilidade da sua função pelas duas partes. Em terceiro lugar, o desempenho desse papel, exige um delicado equilíbrio entre o cultivo de relações autónomas com a Europa e o desenvolvimento de uma coordenação específica com Beijing neste domínio por forma a garantir que para além da prossecução dos seus interesses próprios, a intervenção de Macau não está em contradição com orientações do Governo central e representa, na perspectiva de Beijing, um valor acrescentado para a sua política externa. Em quarto lugar, o sucesso deste projecto depende igualmente da escolha certa dos parceiros europeus. Tendo em conta as características de Macau e a sua condição de actor não-soberano na cena internacional, é de considerar particularmente adequada uma estratégia mais descentralizada com a atribuição de prioridade às relações com governos regionais ou locais no espaço europeu, em vez de concentrar esforços junto dos governos centrais absorvidos na sua relação com Beijing.
A preservação e afirmação da autonomia e identidade de Macau representa uma mais valia para a China no próximo século e constitui o principal critério de aferição do sucesso da reunificação de Macau. As implicações políticas deste segundo teste ao modelo "um país, dois sistemas", nomeadamente para a solução da questão de Taiwan, a capacidade demonstrada pela China para respeitar o essencial dos seus compromissos em relação a HK e a vontade e capacidade dos cidadãos de Macau são factores que contribuem positivamente para que Macau possa, com sucesso, controlar os riscos e tirar o melhor partido das múltiplas oportunidades que o novo século lhe reserva.

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